sábado, 8 de outubro de 2011

A História das Bruxas

À afirmativa de existência de bruxas à forma retratada em registros da Idade Média, incluindo histórias infantis que permaneceram em evidência até os dias atuais, admite-se uma ressalva: elas parecem ter existido apenas no imaginário popular, surgidas na esteira de uma época dominada por medos, quando qualquer manifestação diversa ou mesmo a crença na inexistência de bruxas da forma retratada pelas autoridades clericais era implacavelmente perseguida pela Igreja.
A feitiçaria já era citada desde os primeiros séculos de nossa era. Autores como o filósofo grego Lucius Apuleius (123-170), fazia alusão a uma criatura que se apresentava em forma de coruja (lilith), que na verdade era uma forma descendente de certas mulheres que voavam de madrugada, ávidas de carne e sangue humanos.
Para os intelectuais, estes acontecimentos não passavam do imaginário popular, sonhos, pesadelos e, assim, recusavam-se a admitir a existência de bruxas. Porém, entre muitos povos não era assim: os éditos dos francos salianos falavam da Estrige como se ela existisse de fato. Os penitenciais atestavam a crença nessas mulheres luxuriosas. No início do século XI Burchard, o bispo de Worms, pedia aos padres que fizessem perguntas às penitentes, no intuito de descobrir se eram seguidoras de Satã, (…) se tinham o poder de matar com armas invisíveis cristãos batizados (…) Se sim, quarenta dias de jejum e sete anos de penitências.
Até ao século XIII a Igreja não condenava severamente esse tipo de crendice. Mas, nos século XIV e XV, o conceito de práticas mágicas, heresias e bruxarias se confundiam no julgo popular graças à ignorância. Eram, em geral, mulheres as acusadas. Hereges, cátaros e templários foram violentamente condenados pela Inquisição, tomando a vez aos judeus e muçulmanos, que eram os principais alvos da primeira inquisição (século XIII). Curiosamente, foi exatamente a partir da primeira inquisição que iconografia cristã passou a representar o “Arcanjo Decaído” não mais como um arcanjo, mas com a aparência de deuses pagãos, como Pã e Cernunnos. Tal fato levou, séculos após, à suposição de que bruxas eram adoradoras do demônio, o que não faz sentido, uma vez que a figura do demônio faz parte do dogma cristão, não pertencendo às crenças pagãs e nem existindo personagem de caráter equivalente ao diabo em qualquer panteão pagão. O uso alternativo do nome Lúcifer para designar o mal encarnado, na visão cristã, agravou a ignorância a respeito do culta das bruxas, uma vez que o nome Lúcifer, pela raiz latina, representa portador/fabricante da luz (Lux Ferre), inescapável semelhança ao mito grego de Prometeu, que roubou o fogo dos céus para trazê-lo aos homens.
260px-Persecution_of_witches
O movimento de repressão à bruxaria, iniciado na Idade Média, alcançou maior intensidade no século XV, para, na segunda metade do século XVII, ter diminuída sua chama: o número de processos de feitiçaria no norte da França aumentou de 8, no século XV, para 13 na primeira metade do século XVI, e 23 na segunda metade, chegando a 16 na primeira metade do século XVII, diminuindo para 3 na segunda metade daquele século, e para um único no seguinte. (Claude Gauvard – membro do Institut Universitaire de France).
Em 1233, o Papa Gregório IX admitiu a existência do sabbat e esbat. O Papa João XXII, em 1326, autorizou a perseguição às bruxas sob o disfarce de heresia. O Concílio de Basileia (1431-1449) apelava à supressão de todos os males que pareciam arruinar a Igreja.
Uma psicose se instalou. Comunidades do centro-oeste da França acusavam seus membros de feitiçarias. Na Aquitânia (1453) uma epidemia provocou muitas mortes que foram imputadas à mulheres da região, de preferência as muito magras e feias. Presas, submetidas a interrogatórios e torturadas, algumas acabavam por confessar seus crimes contra as crianças, e condenadas à fogueira pelo conselheiro municipal. As que não confessavam eram, muitas vezes, linchadas e queimadas pela multidão, irritada com a falta de condenação.
Os tratados demonológicos e os processos de feitiçaria se multiplicaram, por volta de 1430, marcando uma nova fase da história pré-iluminista, de trágicas dimensões. Em 1484, o Papa Inocêncio VIII promulgou a bula Summis desiderantes affectibus, confirmando a existência da bruxaria. Em 1486 a publicação do Malleus maleficarum (“Martelo das Bruxas”), que originou a caça às bruxas, mais do que obras anteriores, associava a heresia e a magia à feitiçaria.
A Inquisição, instituída para combater a heresia, agravou a turba de seguidores inspirados por Satã. Havia, ainda, um componente sexista. Os bruxos existiam, mas eram as mulheres, sobretudo, que iam queimadas nas fogueiras medievais.
Em 1602 Anton Praetorius, um teólogo alemão calvinista, teve de publicar o livro “Gründlicher Bericht von Zauberey und Zauberern” (“Relatório profundo da magia, mágicos e feiticeiros”) contra a quimera da bruxaria e tortura.

Nenhum comentário:

Postar um comentário